terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Câmara de Comercialização de Energia Elétrica

CCEE cria atendimento especializado
para setores de energia renovável

Câmara de Comercialização de Energia Elétrica projeta que a capacidade instalada em eólicas deve crescer 205% nos próximos cinco anos O crescimento das fontes renováveis levou a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) a criar um atendimento especializado voltado para empresas que investem nessas usinas. A instituição projeta, com base nos resultados dos últimos leilões, que a capacidade instalada em eólicas deve crescer 205% nos próximos cinco anos, passando dos atuais 3.384 MW para mais de 11.000 MW, enquanto o número de parques deve saltar de 154 para mais de 460. Em relação à biomassa, a fonte já responde hoje por uma capacidade instalada de 9.712 MW e deve chegar a mais de 10.000 MW, com 228 plantas em operação. No caso da energia solar, no último leilão de energia de reserva foram negociados 31 empreendimentos, representando uma capacidade instalada de 890 MW.

Atendimento especializado
A contratação de usinas dessas fontes em leilões e no mercado livre de energia fez com que 170 empresas, representando 228 empreendimentos, se tornassem associadas da CCEE apenas entre 2013 e 2014. O forte aumento da participação desses agentes na CCEE, que soma 2,8 mil associados - entre geradores, comercializadores, distribuidores e consumidores de energia elétrica - sinalizou para a instituição a necessidade de criar uma carteira temática de atendimento.

“Identificamos a oportunidade de qualificar o apoio a esses agentes por meio de um relacionamento mais próximo e especializado. Não apenas pelo crescimento das renováveis em si, mas também pelas características particulares das operações desses empreendimentos no mercado”, explica Cesar Pereira, gerente executivo de Atendimento ao Mercado da CCEE.

O atendimento contemplará inicialmente nove grupos que atuam no setor, escolhidos por critérios de capacidade instalada e número de usinas em operação cadastradas na CCEE. Os participantes dessa primeira etapa contarão com um gestor especializado em energia renovável para atendê-los no âmbito da CCEE. A expectativa é ganhar agilidade para solucionar questões práticas e aprofundar o conhecimento da CCEE em relação às demandas específicas relacionadas a essas fontes.

As associações que representam os investidores desses segmentos - Associação Brasileira de Energia Eólica - Abeeólica e União da Indústria de Cana-de-Açúcar- Unica- forneceram apoio à CCEE na idealização da novidade e também serão parceiras na capacitação da instituição para prestar esse atendimento personalizado. “A ideia é avaliar os resultados da iniciativa e expandir esse tipo de atendimento de forma gradual, com possibilidade de ampliar o escopo para outros segmentos do mercado”, informa Cesar Pereira.

A área de Atendimento da CCEE realiza uma média de quatro mil atendimentos por mês, prestando auxílio às empresas associadas com relação a todos os assuntos relacionados à comercialização de energia e operações no mercado.

Fonte: JORNAL O POVO
@=> http://www.opovo.com.br/app/economia/2014/12/23/noticiaseconomia,3367275/ccee-cria-atendimento-especializado-para-setores-de-energia-renovavel.shtml

China fabrica enfeites de Natal

Cidade chinesa fabrica
60% dos enfeites de Natal do mundo

Cerca de 600 fábricas da vila de Yiwu são responsáveis pela produção da maior parte dos artigos natalinos que adornam o planeta São de 600 fábricas localizadas na vila de Yiwu, 300km ao sul de Shangai, que saem os enfeites que adornam as árvores natalinas de grande parte do mundo.

A cidade responde por 60% da produção mundial dos mais diferenciados artigos natalinos, desde as tradicionais bolinhas coloridas, até gorros vermelhos iluminados com LED. Para atender a alta demanda, os funcionários das fábricas chegar a trabalhar até 12 horas por dia e ganham mensalmente cerca de R$ 850.

Uma matéria do jornal The Guardian denuncia que, apesar de estarem envolvidos diretamente na caracterização do Natal, os chineses que trabalham nas fábricas da vila de Yiwu não têm uma ideia clara do que seja o Natal.

"Deve ser o equivalente ao ano novo Chinês", supôr um dos funcionários ao jornal inglês, que também afirmou nunca ter visto um pinheiro de verdade e de que não sabe o que são os ícones cristãos que ele mesmo vê sendo fabricado todos os dias.

Fonte: JORNAL O POVO 
@=>http://www.opovo.com.br/app/maisnoticias/curiosidades/2014/12/23/noticiascuriosidades,3367404/cidade-chinesa-fabrica-60-dos-enfeites-de-natal-do-mundo.shtml

Impacto ambiental

Impacto da degradação ambiental na saúde
é até 300% maior sobre os pobres

Marcela Belchior
Adital

O efeito da contaminação atmosférica sobre a saúde dos peruanos e peruanas é de 75% a 300% entre os pobres do que entre os não pobres. A informação faz parte do relatório "Mudança climática e indústrias extrativas no Peru” ("Cambio climático e industrias extractivas en el Perú”), publicado pela organização não governamental CooperAcción, que atua na ação solidária para o desenvolvimento, e lançado no último mês de outubro, sob a elaboração do economista Roberto Machado. 
Segundo o documento, além de seus efeitos sobre os ecossistemas e a qualidade de vida em geral, a degradação ambiental teria um impacto regressivo sobre a distribuição de renda e da riqueza, afetando mais os pobres do que os ricos. "Por exemplo, o impacto da contaminação atmosférica urbana sobre a renda — através da deterioração da saúde dos trabalhadores — é muito mais agudo nos pobres do que nos que não o são”, pontua o relatório. 
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Danos aos pobres também incidem na renda das famílias. Foto: Reprodução.
Da mesma maneira, a incidência de doenças transmitidas pela contaminação da água é significativamente maior entre os pobres. Segundo o relatório, a taxa de mortalidade infantil e a incidência de diarreia entre crianças no segmento mais pobre são cinco vezes maiores do que no segmento mais rico. Baseando-se nesses dados e na maior quantidade média de meninas e meninos nos lares peruanos nos setores em situação de pobreza, o Banco Mundial estima que os impactos na saúde associados à contaminação da água são três vezes mais altos entre a população pobre do que entre a população não pobre. 
"A diferença é ainda maior com relação ao impacto sobre a renda: os prejuízos à saúde ocasionados pela água contaminada são 10 vezes maiores nos pobres do que nos não pobres. A contaminação do ar em locais fechados também afeta mais os pobres, o que está muito relacionado com o uso de combustíveis sólidos para cozinhar e para aquecimento (lenha, carvão etc.)”, acrescenta o estudo. O Banco Mundial estima que toda a população urbana e dois terços da população rural que usam esse tipo de combustível são pobres. 
De acordo com o relatório, o Banco Mundial calcula que entre 80% e 85% dos efeitos nocivos da degradação ambiental sobre a saúde recairia sobre a população em situação de pobreza. "Em consequência, uma política vigorosa de combate à degradação ambiental é essencial para melhorar a equidade no país sul-americano, cujos níveis de desigualdade (...) são piores que os observados em meados das décadas de 1990 e 1980”, acrescenta o documento.


Custos com a degradação 
Conforme o documento, em comparação com outros países, o custo da degradação ambiental no Peru é alto. Os danos passam pela saúde e o abastecimento de água da população, contaminação atmosférica, desastres naturais, exposição ao chumbo, contaminação do ar em locais fechados, degradação do solo, desmatamento e coleta de dejetos municipais. 
Para enfrentar todas essas questões, o custo econômico da degradação ambiental anual no país gira em torno de 3,9% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo estimativa do Banco Mundial. Os maiores gastos estariam relacionados à saúde e abastecimento de água (1,1% do PIB), seguido da contaminação atmosférica (0,8%).

Fonte: http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=83745

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Entrevista de Carlos Lessa

Entrevista especial com Carlos Lessa
Segunda, 28 de julho de 2014

Brasil: Impossível pensar o futuro sem discutir a geopolítica mundial. 


“Há muitos anos eu já disse que nós caminhávamos imensuravelmente para a desaceleração da economia, e infelizmente tudo que imaginei aconteceu. Hoje o Brasil está tendo dificuldades imensas de manter se movendo como estava se movendo”, assinala o economista.

“A verdade é que se houvesse uma redução significativa do valor da dívida das famílias, das empresas e dos Estados nacionais, haveria naturalmente, sem grande trauma, uma mudança no perfil de retração da riqueza do mundo.” A declaração é do economista Carlos Lessa à IHU On-Line, ao comentar as razões de ainda haver tantas desigualdades sociais no mundo. Segundo ele, “o que a história está mostrando é que os comandos desse sistema financeiro assumiram o comando da economia mundial, porque é muito difícil mexer no valor dessa dívida”.

Na entrevista a seguir, concedida por telefone, o ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento – BNDES menciona a dívida da Argentina como um exemplo que diz “respeito à saúde do mundo como um todo; (...) ela é uma espécie de preliminar das dificuldades que estão à frente”. E alfineta: “Se 93% aceitaram a proposta argentina e estão recebendo segundo essa proposta, como 7% podem derrubar tudo?”.

Lessa também comenta a criação do banco do BRICs como uma possibilidade de “restabelecer liquidações compensatórias de dinheiro entre as moedas dos países do BRICs”. Entretanto, enfatiza, “se ele fizer isso, já está introduzindo uma dimensão importante no jogo financeiro mundial. E minha pergunta é: Vão fazer, ou não vão fazer? É a sério, ou não é a sério? Porque isso já é uma tentativa de reduzir o peso do dólar; e eu não vejo como os americanos concordam com isso tranquilamente”. E cutuca: “A presidenta Dilma foi à última reunião de Davos dizer que o Brasil está inteiramente consciente e subordinado à ideia do Consenso de Washington, mas aí esse sistema de compensações monetárias entre as moedas dos BRICs não é o que Washington quer; por outro lado, o silêncio brasileiro com respeito à questão argentina — o nosso comportamento está sendo muito encabulado e retraído — é o que Washington quer. Então, eu não sei, e a pessoa (Dilma) para mim também não sabe, apesar de estar perdendo o campeonato”.

Segundo ele, apesar de a população ter melhorado o padrão de vida nos governos Lula e Dilma, especialmente no que se refere à distribuição da renda, “o governo do PT não usou esse ‘oxigênio’ que o Brasil teve para dar sustentabilidade no longo prazo à melhoria”. Na avaliação dele, “para frente, o Brasil vai se confrontar com um problema muito sério: um pedaço enorme do patrimônio das empresas brasileiras, das empresas que estão no Brasil, dos bancos brasileiros e das famílias ricas, está apoiado na dívida das famílias pobres que se endividaram para comprar automóvel, geladeira e mobiliário, então, terá uma queda de braço para frente no país”.

Defensor de um projeto nacional, Carlos Lessa é categórico quanto ao assunto: “Nós estamos órfãos de um projeto nacional. Agora, é evidente que qualquer projeto nacional começa por projetar o Brasil do futuro. (...) Nós fomos achando que é possível tocar o futuro sem discutir o futuro, então é complicado”. E conclui: “Pelo menos três dos grandes países periféricos do mundo têm projetos nacionais claros, enquanto o Brasil não tem nenhum. Nós nem sequer discutimos a geopolítica mundial; nós não temos posicionamento nenhum”.

Carlos Lessa é formado em Ciências Econômicas pela antiga Universidade do Brasil e doutor em Ciências Humanas pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Campinas (Unicamp). Em 2002, foi reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Ele também foi presidente do Bndes.

Confira a entrevista.

Carlos Lessa

IHU On-Line - Como, na Economia, se define e se entende o conceito de “desigualdade”?

Carlos Lessa – Colocando-se a ideia de renda, a desigualdade se mede por diversos coeficientes, que medem a dispersão das extremidades em relação ao valor médio. Isso são estudos de distribuição de renda, desenvolvidos há muito tempo, em 30, 40 países do mundo.

Agora, o que não se faz — e essa é a dimensão que está sendo levantada para discussão — é a distribuição do patrimônio, ou seja, tudo aquilo que representa a chamada riqueza do indivíduo. Nesse sentido, a riqueza do indivíduo pode ir desde a sua casa própria e o que está nela, até participações percentuais nas empresas — que são as participações societárias — e participações da dívida que outros têm, e esses outros podem ser famílias, empresas e Estados nacionais. Então, essa dívida também faz parte da riqueza.

Estudos recentes demonstraram que, embora a distribuição de renda tenha melhorado em diversos países — principalmente nos chamados de primeiro mundo —, a distribuição do patrimônio não melhorou. Ou seja, apesar de uma quantidade crescente de famílias do primeiro mundo possuir casa própria, há um crescimento enorme da dívida das famílias, das empresas e dos Estados nacionais, e essa nova dívida, que faz parte do patrimônio, cresce em uma velocidade tal, que o patrimônio se mantém praticamente o mesmo.

IHU On-Line – E como o senhor vê essa má distribuição do patrimônio?

Carlos Lessa – A verdade é que se houvesse uma redução significativa do valor da dívida das famílias, das empresas e dos Estados nacionais, haveria naturalmente, sem grande trauma, uma mudança no perfil de retração da riqueza do mundo. Agora, o que a história está mostrando é que os comandos desse sistema financeiro assumiram o comando da economia mundial, porque é muito difícil mexer no valor dessa dívida. Por exemplo, o que está acontecendo com a Argentina, hoje, é uma tentativa de forçá-la a pagar por uma dívida que foi contraída no passado. Porque, na verdade, no momento em que se diz que a dívida pode não ser paga, se retira dela o valor patrimonial que ela tem. Essa questão da Argentina diz respeito à saúde do mundo como um todo; não acho que ela vá definir o futuro da humanidade, mas é uma espécie de preliminar das dificuldades que estão à frente.

“A partir do governo de Collor de Mello, o Brasil não persegue nada”

IHU On-Line – Nesse sentido, o valor que está sendo cobrado da dívida da Argentina é equivocado?
Carlos Lessa – É totalmente equivocado; estou do lado da posição argentina. A Argentina negociou uma redução da dívida numa situação em que está fracamente destruída como país, e essa negociação foi aceita por 93% dos diretores; 7% não opinaram porque os fundos abutres compraram. A Justiça norte-americana diz que a Argentina deve pagar a dívida integralmente, e com prioridade para esses 7%. Isso é algo absolutamente espantoso, porque se 93% aceitaram a proposta argentina e estão recebendo segundo essa proposta, como 7% podem derrubar tudo? Então, por isso, uma das coisas mais interessantes que aconteceram nas últimas semanas foi o fato de os países latino-americanos da Organização dos Estados Americanos - OEA terem votado a favor da Argentina e depois repetirem o gesto quando houve esse encontro dos BRICs em Fortaleza. Trata-se de um recado dizendo para ter cuidado, porque o tamanho dessa dívida colossal faz com que necessariamente um pedaço dela seja desvalorizado.

IHU On-Line - Como vê a criação do banco do BRICs? 

Carlos Lessa – Estou cheio de dúvidas a respeito. Em uma primeira aproximação, a ideia do BRICs é uma ideia geopolítica de criar uma terceira interlocução em nível mundial. Então, por esse lado, o BRICs tem importância geopolítica para o Brasil. Agora, se vai ter importância econômica, tenho minhas dúvidas. O que o banco do BRICs pode fazer é restabelecer liquidações compensatórias de dinheiro entre as moedas dos países do BRICs. Se ele fizer isso, já está introduzindo uma dimensão importante no jogo financeiro mundial. E minha pergunta é: Vão fazer, ou não vão fazer? É a sério, ou não é a sério? Porque isso já é uma tentativa de reduzir o peso do dólar; e eu não vejo como os americanos concordam com isso tranquilamente.

IHU On-Line - Mas fala-se também que o banco tem o objetivo de financiar projetos de infraestrutura entre os países.

Carlos Lessa – Esse é o pretexto que está por trás da ideia de criar um sistema de compensações monetárias que não esteja baseado no dólar. Agora o pretexto para criar o banco é o pretexto que pode financiar projetos de infraestrutura no longo prazo sem lançar mão de reserva de dólar. Isso reduz o peso do dólar e é um efeito político ou geopolítico importante para um banco. Contudo, quero ver se ele é real mesmo; não é que eu queira ser São Tomé (ver para crer), eu só quero ver como isso vai se desdobrar, porque, por exemplo, a presidente Dilma foi à última reunião de Davos dizer que o Brasil está inteiramente consciente e subordinado à ideia do Consenso de Washington, mas aí esse sistema de compensações monetárias entre as moedas dos BRICs não é o que Washington quer; por outro lado, o silêncio brasileiro com respeito à questão argentina — o nosso comportamento está sendo muito encabulado e retraído — é o que Washington quer. Então, eu não sei, e a pessoa (Dilma) para mim também não sabe, apesar de estar perdendo o campeonato.


“Essa comparação não dá certo e é complicada por uma razão: o PT tentou se criar ‘anti-Getúlio’”

IHU On-Line - Qual é o papel do Brics na arquitetura financeira internacional?

Carlos Lessa – Ainda não tem, mas se ele montar esse sistema de compensações bilaterais, passará a ter. Quer dizer, tem um lado aí que achei muito interessante nesse encontro do Brics, o de sair um financiamento para a Argentina. Outra ação interessante — e há tempo gosto muito do que a diplomacia brasileira faz — foi, na reunião da União de Nações Sul-Americanas - UNASUL e do Mercado Comum do Sul - MERCOSUL, colocar os países sul-americanos e seus presidentes junto aos presidentes do BRICs. Isso foi um gesto político muito bonito e muito importante, porque marcou certa posição, mas por enquanto estamos na retórica.

IHU On-Line - O senhor leu o livro “Capital in the Twenty-First Century” [O capital no século XXI] de Thomas Piketty? Quais suas impressões?

Carlos Lessa – Li alguns trechos. Não li todo, pois estou com descolamento da retina. Piketty fez diversos exercícios lançando mão das informações disponíveis para demonstrar isso que eu disse a você, ou seja, que a destruição da riqueza do patrimônio não se modificou, apesar de haver melhorias na distribuição de renda.

IHU On-Line - Quais são as principais dificuldades do Brasil em relação às desigualdades?

Carlos Lessa – Os programas que o governo do PT implantou desde 2002, desde o primeiro mandato do Lula, do segundo mandato dele e do início do mandato da presidente Dilma, tiveram um efeito importante do ponto de vista de distribuição de renda, somente isso. Como o Brasil teve uma melhoria espetacular na sua relação de trocas com o mundo, porque os produtos que o Brasil vendia para o mundo se valorizaram — tecnicamente nós dizemos que a relação de troca foi extremamente favorável para o Brasil até 2008, 2009 —, os governos do PT aproveitaram para tocar para frente uma política de distribuição. Ou seja, melhoraram muito significativamente o salário mínimo real, que é a chave da disfunção de renda para a baixa renda do Brasil, que é o indexador geral de todos que têm ou não carteira assinada, e criou alguns programas de assistência social, como o Programa Bolsa Família, e isso melhorou a base da população brasileira.

É impressionante como as pessoas melhoraram o seu padrão de vida. Só que o problema é o seguinte: o governo do PT não usou esse “oxigênio” que o Brasil teve para dar sustentabilidade no longo prazo à melhoria. Agora, para a frente, o Brasil vai se confrontar com um problema muito sério: um pedaço enorme do patrimônio das empresas brasileiras, das empresas que estão no Brasil, dos bancos brasileiros e das famílias ricas, está apoiado na dívida das famílias pobres que se endividaram para comprar automóvel, geladeira e mobiliário, então, terá uma queda de braço para frente no país. Mas o que acho engraçado é que a disputa eleitoral brasileira nem tocou nesse assunto. Sou muito simpático que a universidade esteja preocupada em discutir isso, porque a universidade tem de criar uma geração que saiba pensar e saiba pensar o Brasil, um Brasil no mundo e um Brasil voltado aos brasileiros. Essa discussão é fundamental.

IHU On-Line – O senhor é um defensor do desenvolvimento de um projeto nacional. Em que medida esse projeto pode ter implicações na superação das desigualdades? E em relação a isso, existe no Brasil algum projeto nacional?

Carlos Lessa – Não. Nós estamos órfãos de um projeto nacional. Agora, é evidente que qualquer projeto nacional começa por projetar o Brasil do futuro, o Brasil utópico, o Brasil que nós sonhamos. Eu sonho com um Brasil em que as desigualdades sociais sejam relativamente pequenas, com um Brasil em que todos os brasileiros tenham acesso à casa própria, tenham uma educação de qualidade, acesso à saúde, possibilidade de utilizar o seu tempo para absorver os bens culturais ou simplesmente ao lazer. Eu sonho com um Brasil que seja justo para os brasileiros, e não acho que o Brasil é justo com os brasileiros. O país vai ter de discutir isso, só que essa discussão nem sequer começou.

“O Brasil quer ser uma Porto Rico enorme do Atlântico Sul? Ou o país quer ter uma grande importância na formação de um continente sul-americano unificado?”

Há muitos anos eu já disse que nós caminhávamos imensuravelmente para a desaceleração da economia, e infelizmente tudo que imaginei aconteceu. Hoje o Brasil está tendo dificuldades imensas de manter se movendo como estava se movendo. Talvez isso tenha um lado muito ruim, porque gera uma perplexidade, uma angústia, uma interrogação forte para as pessoas, uma insegurança das pessoas em relação ao seu “estar no mundo”, mas, por outro lado, pode ser que force as pessoas a discutir que futuro se pensa para o Brasil, porque até agora essa discussão não existe.

IHU On-Line - Esse é um problema do Brasil ou há um limite de se ter um projeto nacional em tempo de globalização?

Carlos Lessa – Isso não é verdade, porque existem muitos países que estão na globalização e estão perseguindo projetos nacionais. O exemplo principal é a China, mas diria que de certa maneira a Índia e a Rússia também têm projetos nacionais. Então, pelo menos três dos grandes países periféricos do mundo têm projetos nacionais claros, enquanto o Brasil não tem nenhum. Nós nem sequer discutimos a geopolítica mundial; nós não temos posicionamento nenhum. Por exemplo, qual é o posicionamento dos brasileiros com respeito ao que vem acontecendo na Argentina? A impressão que eu tenho é de que nenhum — apesar de vocês estarem aí no Rio Grande do Sul. Qual é o posicionamento dos brasileiros a respeito do que vem acontecendo na Ucrânia? Zero; nem se debate. Quem está discutindo no Brasil o projeto eurasiano que Vladimir Putin está desenvolvendo? Ninguém. Só que esse projeto vai levar a Rússia a se aliar ao Japão, por um lado, e à China, por outro, colocando a Europa na dependência total da Rússia. Nós estamos discutindo isso? Não. A rota dos navios que liga o Japão com a Europa vai agora passar a ser pelo Ártico, porque com o degelo e as frotas de quebra-gelo russas isso se torna possível. Só que essa rota, que é ótima para o Japão, que encolhe sete mil léguas submarinas a distância entre o Japão e a Europa, é péssima para o Brasil, porque nos desloca mais para a periferia do mundo. Estão discutindo isso? Não. Nós fomos achando que é possível tocar o futuro sem discutir o futuro, então é complicado.

IHU On-Line – Pode dar outros exemplos dos projetos nacionais desses países?

Carlos Lessa – Claro. O projeto da China é óbvio: quer voltar a ser o império asiático e mundial. Para isso, combina três dimensões: procurar ter supremacia no comércio mundial, exportando produtos industrializados e importando matérias-primas de alimentos; quer estar na vanguarda tecnológica do mundo, usando os poderes que dispõe para empurrar a tecnologia para frente; e quer, de maneira muito clara, dominar totalmente a esfera asiática. E nós não temos nenhum projeto, nem com respeito às relações com a Argentina nós temos um projeto claro.

IHU On-Line – O senhor é bastante getulista...

Carlos Lessa – Total. Mas nós não podemos fazer invocações de fantasmas, pois nenhum fantasma se materializa. Getúlio foi uma liderança inquestionável para esse país. Eu gosto de dizer que com Getúlio, contra Getúlio e sem Getúlio, o Brasil se moveu 50 anos para perseguir a industrialização. E, a partir do governo de Collor de Mello, o Brasil não persegue nada.

IHU On-Line - Depois dele, quais presidentes pensaram em um projeto de nação?

Carlos Lessa – Ele foi o presidente brasileiro mais consistente e coerente nisso. Eu diria que o Rodrigues Alves [1], de certa maneira, e o mineiro Arthur Bernardes [2] tinham visões claras da necessidade de um projeto nacional. Mas, quem adotou integralmente e foi fiel ao projeto nacional, foi Getúlio.

IHU On-Line - Alguns tentam comparar ou fazer alguma aproximação entre Lula e Getúlio. Como vê essa tentativa?

Carlos Lessa – Essa comparação não dá certo e é complicada por uma razão: o PT tentou se criar “anti-Getúlio”. Eu lembro do Lula dizendo a seguinte frase: “A Consolidação das Leis do Trabalho - CLT é o AI-5 dos trabalhadores”. Ou seja, para ele, a CLT impediria qualquer ingerência dos trabalhadores em seu futuro. O PT era antigetulista, e depois começou a diminuir um pouco isso, mas ao mesmo tempo pegou do pragmatismo de Getúlio a pior de todas as dimensões, porque Getúlio era pragmático nas alianças que fazia, mas apesar das alianças ele nunca permitiu dissolver os objetivos nacionais. Enquanto isso, o PT vende o petróleo no leilão de Libra. Getúlio nunca permitiu que a privatização fosse um elemento pragmático a ser negociado; soberania nacional sempre foi fundamental para Getúlio. E esse conceito nem existe no governo Lula.

Eu não estou querendo polemizar com o PT; minha preocupação é outra. Minha preocupação é que os estudantes da universidade, os gaúchos, que são a vanguarda do pensamento nacional brasileiro, voltem a discutir o projeto Brasil, mesmo que vocês troquem desaforos entre vocês, são obrigados a explicitar os debates.


“Fico encabulado em ver o Chile assumindo mais
defesa da Argentina hoje do que o Brasil”

O Brasil quer ser uma Porto Rico enorme do Atlântico Sul? Ou o país quer ter uma grande importância na formação de um continente sul-americano unificado? Se for isso, nós temos de cuidar a visão da Argentina que o Brasil tem. Eu fico encabulado em ver o Chile assumindo mais defesa da Argentina hoje do que o Brasil. Nesse sentido, os gaúchos são a grande fronteira de nacionalismo do Brasil.

IHU On-Line - Como o senhor vê as campanhas à Presidência da República? Algum candidato apresenta ou tem em perspectiva um projeto de nação?

Carlos Lessa – Não. Uma das minhas angústias é que o desdobramento da campanha presidencial não está absolutamente politizando o Brasil no bom sentido. O que está acontecendo agora é uma competição para saber quem é cúmplice do mensalão, para descobrir algo sobre o aeroporto do Aécio, algo contra o Eduardo, amanhã talvez apareça algo contra a Dilma, e vai ficar nisso. Isso não é absolutamente uma discussão política; é uma discussão que não explicita as escolhas que o Brasil tem de fazer. E se a opinião pública mantiver a posição, como está hoje, de que os políticos são a mesma coisa e que os partidos políticos não servem para nada, eu não sei o que vai acontecer; vamos numa conjuntura internacional muito difícil.

(Por Patricia Fachin)

NOTAS

[1] Francisco de Paula Rodrigues Alves (Guaratinguetá, 7 de julho de 1848 - Rio de Janeiro, 16 de janeiro de 1919): advogado, político brasileiro, Conselheiro do Império, presidente da província de São Paulo, presidente do estado, ministro da fazenda e quinto presidente do Brasil.

Governou São Paulo por três mandatos: 1887-1888, como presidente da província; como quinto presidente do estado, de 1900 a 1902; e como nono presidente do estado, de 1912 a 1916.

Rodrigues Alves foi o último paulista a tomar posse como presidente do Brasil. Foi eleito duas vezes, cumpriu integralmente o primeiro mandato (1902 a 1906), mas faleceu antes de assumir o segundo mandato (que deveria se estender de 1918 a 1922).

[2] Artur da Silva Bernardes (Viçosa, 8 de agosto de 1875 - Rio de Janeiro, 23 de março de 1955): advogado e político brasileiro, presidente de Minas Gerais de 1918 a 1922 e presidente do Brasil entre 15 de novembro de 1922 e 15 de novembro de 1926.


FONTE: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/533589-brasil-impossivel-pensar-o-futuro-sem-discutir-a-geopolitica-mundial-entrevista-especial-com-carlos-lessa-