terça-feira, 17 de março de 2015

DESCOBRIMENTO DO BRASIL PELO NAVEGADOR VICENTE PINZON

 
DESCOBRIMENTO DO BRASIL
O navegador espanhol Vicente Pinzón

DIÁRIO DO NORDESTE - 26/JAN/2010 - Tese de que o espanhol foi o primeiro europeu a desembarcar no Brasil é defendida pelo jornalista e pesquisador Rodolfo Espínola


Embora não seja festejado nem lembrado porque não faz parte da nossa história oficial, hoje completam-se os 510 anos do desembarque do navegador espanhol Vicente Yañez Pinzón no lugar que ele batizou de Santa Maria de La Consolación, local este que a moderna cartografia indica como sendo a Ponta do Mucuripe, a 3º 42" S, a cerca de 10 km do centro de Fortaleza. Antes, portanto, da chegada do português Pedro Álvares Cabral, em 22 de abril de 1500, no Sul da Bahia. Mas no momento em que se discute o Descobrimento do Brasil, quando o segundo chegou primeiro, identifica-se sem muito esforço a origem de um intrincado imbróglio. A história dessa ponta onde o litoral cearense deixa sua forma vertical semi-meridiana a leste para assumir uma posição horizontalizada a oeste guarda segredos seculares. Santuário dos surfistas, cobiçada pela especulação imobiliária e agora pela indústria naval, sobrevive heroicamente.

A Ponta do Mucuripe coincide com o Descobrimento do Brasil, uma vez que comprovado está (pelo menos oficiosamente) ter sido por ela onde desembarcou o primeiro europeu em terras brasileiras. Entretanto por razões que a própria história não explica, ou nunca quis explicar, esse fato não ganhou ainda a dimensão que deveria. Está colocado nos livros sem muita profundidade, provavelmente em função dos interesses do colonizador. Mas um dia, talvez, essa omissão seja cobrada pelas futuras gerações ralhando quem preferiu colocá-la debaixo do tapete para assegurar sua presença no Brasil. Aliás, já deixamos até de comemorar o dia (oficial) do Descobrimento, talvez por falta de sustentação histórica ou de entusiasmo cívico. Ou as duas coisas juntas!

Pesquisa

A história do descobrimento do Brasil precisa ser recontada como ela realmente aconteceu e não como querem que ela tenha acontecido. Com todo o respeito a Pedro Álvares Cabral, não foi ele o primeiro europeu que pisou no Brasil: foram dois espanhóis, Vicente Pinzón e Diogo de Lepe. O primeiro na ponta do Mucuripe, em janeiro de 1500 e o segundo, um mês depois, no cabo de Santo Agostinho, perto do Recife. Referidas viagens estão provadas através de documentos guardados no Arquivo Geral das índias, em Sevilha, na Espanha, como observa o jornalista Rodolfo Espínola que estuda esse assunto cerca de 20 anos, tendo publicado, inclusive livro especifico sobre o tema - Vicente Pinzon e a Descoberta do Brasil -, esgotado, a partir de pesquisas realizadas no Arquivo das Índias, na Torre do Tombo, em Portugal e Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro.

Capistrano de Abreu e Francisco Adolfo Varnhagen reconheceram no século XIX a primazia espanhola. O contra-almirante Max Justo Guedes, ex-diretor da Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural da Marinha do Brasil, um dos maiores e mais respeitados experts do tema assegura com boa argumentação ter sido a ponta do Mucuripe o local do desembarque de Pinzón, em 26 de janeiro de 1500. Foi quem fez a reconstituição do périplo de Pinzon, em 1500, desde a sua saída de Palos de La Fronteira, na Espanha até a Ponta do Mucuripe, uma peça rica e incontestável, disse Espínola, ao informar que, "na Espanha, até hoje, Vicente Pinzón é lembrado e festejado pelo fato de ter sido o descobridor de duas Américas: a do Norte, com Colombo, em 1492, no comando Nina e, oito anos depois, a do Sul, em 1500, com a mesma embarcação, quando atingiu a Ponta do Mucuripe".

Não existe, aliás, na história das grandes descobertas nenhum navegador que tenha em seu currículo façanha desta dimensão. Na Espanha são professores-doutores de diversas universidades, baseados em insuspeitas fontes documentais, guardadas em arquivos espanhóis, como o das Índias, Simancas e de Madrid quem avalizam esta tese. Todos bem distantes das eventuais picuinhas bairristas, regionalistas ou comprometidos com versões que não correspondem com a verdade dos fatos, não têm qualquer dúvida sobre a prioridade espanhola. Juan Manzano e Manzano e Francisco Morales Padron, da Universidade de Madri, Jesus Varela Marcos, da Universidade de Valadolid, Carlos Bruneto, da Universidade de Tenerife, nas Canárias e, Emelina Acosta, da Universidade de Burgos, além do casal Juan Gil e Consuelo Varela, da Universidade de Sevilha, que representam o melhor da atual historiografia espanhola, são alguns dos muitos autores que relatam as grandes descobertas do final do século XV e início do XVI.

O terceiro descobridor

Em Portugal, os historiadores Jorge Couto e Joaquim Barradas de Carvalho defendem outra tese: não foi Pinzon Nem Cabral. Foi o lusitano Duarte Pacheco Pereira, que teria passado - e não desembarcado - em algum lugar da região norte, provavelmente entre o Pará e a ilha do Marajó, em 1498. Seus argumentados estão em enigmáticas frases contidas no Esmeraldo de Situ Orbis, escrito entre 1505 e 1508, por Pereira, quando sugere ter visto "grandes terras e grandes ilhas" durante uma viagem que teria realizado secretamente, a pedido de dom João II. Referida tese não encontra sustentabilidade pelo fato de não apresentar os mínimos elementos que a comprovem, como a data de partida e de chegada, tipo de embarcação utilizada, que escalas teria feito e com quem estava acompanhado. Não existe nada, apenas a descrição de Pereira, cheia de especulação, hipóteses, ilações. Tudo isso, porem, era necessário, justificam Couto e Carvalho, por causa da rigorosa política de segredos imposta por dom João II ao movimento naval português naquela época. Mas a realidade hoje em Portugal é outra: até livros distribuídos por jornais locais indicam Pinzon como o primeiro europeu que chegou no Brasil.

A importância da presença de Vicente Pinzón para a historiografia brasileira - cearense e principalmente para Fortaleza deve ser avaliada não apenas sob o ponto de vista histórico, mas e, principalmente, com uma visão futurística para a Ponta do Mucuripe onde, aliás, encontra-se soterrado na praia Mansa um dos raríssimos vestígios da presença americana durante a II Guerra Mundial. Trata-se de um cais de cerca de 100m, construído especialmente para receber combustíveis, mantimentos e armas. O jornalista Rodolfo Espínola defende a monumentalização da Ponta do Mucuripe na perspectiva de destacar o desembarque do espanhol Vicente Pinzon e a revelação do cais construído por engenheiros americanos, entre 1942 e 1943.

E lembra que está em Sobral, aliás, um dos maiores e mais perfeitos exemplos de recuperação de um fato histórico, com ressonância mundial: trata-se do Museu do Eclipse, iniciativa do então prefeito Cid Gomes, que tem conseguido atrair para a cidade cientistas e turistas de todo o mundo em razão de ter sido em Sobral a constatação da Teoria da Relatividade, do cientista Albert Einstein durante o eclipse de 29 de maio de 1919. A instalação do Museu do Eclipse em Sobral representa hoje para o Brasil uma notável iniciativa de estimular o ensino, a divulgação e o despertar do interesse pela cultura científica, tendo em vista a importância internacional obtida pelo eclipse de maio de 1919.

História preservada

"Para orientar sua instalação e transformá-lo em centro de estudos, Gomes contou com a assessoria do astrônomo Ronaldo Rogério Freitas Mourão, que resgatou o passado de modo brilhante. O fato de Pinzón ter chegado à ponta do Mucuripe primeiro que Cabral poderia estimular novas pesquisas sobre o assunto não apenas pela comunidade acadêmica, mas, e, principalmente, por entidades culturais governamentais e não governamentais, sob pena de passarmos o 511º desta discussão secular batidos. 

Os comodistas, certamente reagirão, defendendo a velha política do que não se mexe no que esta quieto", provocou Espínola ao explicar que, "talvez isto aconteça por preguiça ou desconhecimento da dimensão deste fato". E atacou: "o exemplo de Sobral aconteceu por causa da sensibilidade do seu então prefeito que, hoje, por coincidência é o governador do Estado que pode, muito bem, redefinir o aproveitamento da Ponta do Mucuripe, dando-lhe projeção mundial, independente da sua disposição de construir neste local um estaleiro", destacou o jornalista ao sugerir o aproveitamento desta área em um grande centro cultural, montado na história que acumula na perspectiva de torná-la visível para o mundo.

Fonte: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/vicente-pinzon-510-anos-depois-1.713260